12.9.09

Fogo nas Flores

Há fogo nas flores e ninguém que repare.

Ardem os jacintos, consomem-se as suas pétalas nas labaredas. E todos que passam nem reparam, demasiado emparedados nas próprias vidas, nas suas rotinas, no seu canteiro jardinado, para repararem naqueles dois jacintos que são engolidos pelas chamas.

O Sol brilha sobre eles, já que todas as flores pertencem ao seu jardim. Brilha preocupado, sem perceber que apenas aviva as chamas, porque também ele está demasiado preocupado com o culto do seu próprio ego para pensar em salvar os jacintos. Há fogo nas flores até à noite e só muito dentro dela deixa de haver.

Repousam as cinzas dos dois jacintos, exaustas de sua incineração. Só aí, quando já foi consumida a última gota de seiva, quando se anulou a beleza daquelas flores, quando cada grama da sua vida vegetal foi transformada em pó porque ninguém olhou acima dos seus canteiros e das suas flores; só aí chega o Vento, lamentando-se pela sua parte da culpa ao avivar também o fogo em vez de soprar para o apagar. Ele vê-os, queimados e cadaverizados, e leva-os, um dia vistosos e coloridos, agora mortos e cinzentos, e assim os leva; leva-os, e chora ao transportá-los, vertendo as suas cinzas em todos os canteiros. E por isso agora todos os canteiros têm jacintos, como aqueles dois que arderam ignorados pelo Sol e chorados pelo Vento. Mas nem assim se levantam os olhos quando há fogo nas flores.



[25.08.2009]

1 comentário:

goodfriday disse...

oh filho, ninguém nega o teu talento literário, mas 'incineração' e 'cadaverizados' confesso que me remete demasiado para o holocausto.